Documento da Força-Tarefa sobre Mercados de Natureza, com sete recomendações ambiciosas e práticas, é lançado logo após a Cúpula da Amazônia e apresenta propostas em relação à Declaração de Belém, divulgadas pelos presidentes dos Estados Partes da OTCA
- A Força-Tarefa sobre Mercados de Natureza lança hoje seu relatório final com sete recomendações visando garantir impactos positivos para clima, natureza e pessoas na economia global;
- Formuladores de políticas públicas, bancos centrais e reguladores financeiros são provocados a elevar a agenda da bioeconomia nas cúpulas globais, como G20, cuja presidência será exercida pelo Brasil a partir de dezembro, e COP30, que terá Belém como sede em 2025;
- Uma das prioridades apontadas no relatório é realinhar a economia global para valorizar produtos e serviços da natureza e incluir povos indígenas e comunidades locais como protagonistas nas tomadas de decisão. Este também foi um dos pontos acordados na Declaração Presidencial da Cúpula da Amazônia (item 55);
- Porém, enquanto a Declaração Presidencial (item 61) reconhece a importância do enfrentamento de atividades ilegais e crimes contra a natureza, o relatório da Força-Tarefa vai além e demanda proatividade de atores do setor financeiro para não investirem, mesmo que involuntariamente, nos mercados ilegais;
- Mercados de commodities agrícolas são o principal alvo para uma governança mais robusta e eficaz.
10 de agosto de 2023, Belém (PA) – Um inédito e histórico manifesto, lançado por um grupo global de lideranças políticas, indígenas, empresariais e financeiras, propõe o redesenho dos mercados globais para garantir que tenham impacto positivo no clima e na natureza, assim como na redução da desigualdade.
O documento Colocando os mercados de natureza para funcionar: como moldar uma economia global da natureza no século 21 lançado hoje, em Belém (PA), pela Força-Tarefa sobre Mercados de Natureza durante o evento “Inovação, Finanças & Natureza” detalha como a mudança sem precedentes em direção à precificação da natureza na economia pode tornar os mercados mais eficientes para as pessoas e o planeta, desde que se consolide a partir de boas práticas de governança a fim de evitar iniciativas enganosas de “greenwashing” ou que ampliem as desigualdades e destruam ainda mais a natureza.
Reforçando o papel de protagonista que o Brasil exercerá no G20, Marcelo Furtado, diretor da NatureFinance e co-líder do secretariado da Força-Tarefa, destaca a importância do país nestas discussões. “Alterações que são urgentemente necessárias nas políticas e regulamentações financeiras e monetárias, bem como nas regras de comércio e investimento, poderiam ser promovidas pelo Brasil como uma importante economia de natureza durante a sua presidência do G20, em 2024, e ao ser sede da COP30, em 2025.”
As recomendações incluem, por exemplo, avançar na rastreabilidade nos mercados globais de commodities alimentares – exigindo que os negociantes levem em conta a natureza e o clima – e garantir que os mercados de carbono e de créditos de biodiversidade ofereçam preços justos aos países ricos em recursos naturais, aos povos indígenas e a comunidades locais, aprofundando com ações específicas elementos mencionados no item 71 da Declaração Presidencial da Cúpula da Amazônia.
Também tratam da necessidade de tornar obrigatórias as cadeias de valor livres de crimes contra a natureza, como garimpo e pesca ilegal. Até agora, além da alarmante perda de ecossistemas biodiversos, a governança inadequada para interromper o tratamento da natureza como um recurso ilimitado e gratuito pela economia acelerou a crise climática, intensificou as desigualdades e minou tanto a estabilidade financeira quanto a segurança alimentar.
As recomendações reconhecem que qualquer solução para a crise da natureza, seja política ou baseada no mercado, não terá sucesso sem envolver os guardiões das florestas e sua biodiversidade na formulação e execução de soluções eficazes, em particular os povos indígenas e comunidades tradicionais. De acordo com a organização WWF, cerca de 80% da biodiversidade mundial encontra-se em Terras Indígenas e comunidades locais.
“É fundamental que os povos indígenas estejam no comando do design e da governança dos mercados de natureza. Sem a natureza, não há vida em nosso planeta nem uma economia sustentável”, diz Almir Narayamoga Suruí, cacique-geral do povo Paiter Suruí e membro da Força-Tarefa.
Para Joaquim Levy, diretor de Estratégia Econômica e Relações com o Mercado, do Banco Safra, e integrante da Força-Tarefa, “há espaço para os mercados transformarem a maneira como recompensamos a contribuição da natureza para a economia e os guardiões da natureza, incluindo maneiras de limpar as cadeias de valor, envolvendo consumidores e garantindo maior divulgação de produtores, traders e investidores”.
O manifesto argumenta que a bioeconomia depende de incentivos políticos, de regulamentação e novos desenhos de governança em níveis local, regional e internacional.
“Os mercados de natureza são uma ponte para uma mudança total em nosso sistema econômico”, afirma Sandrine Dixson, presidente do Grupo de Impactos Econômicos e Sociais da Comissão Europeia e membro da Força-Tarefa sobre Mercados de Natureza. Segundo ela, uma verdadeira transição requer “não apenas financiar a mudança por meio de soluções de baixo carbono e baseadas na natureza, mas também inovações nos sistemas financeiros e econômicos para realmente atender simultaneamente às pessoas, ao planeta e à prosperidade”.
Construção coletiva – As sete recomendações da Força-Tarefa são baseadas nas melhores práticas e, embora muitas delas já estejam em andamento, o relatório propõe que sejam aceleradas e ganhem escala buscando catalisar mudanças globais com urgência e determinação. São elas:
1. Alinhar a arquitetura econômica e financeira a uma economia global de natureza equitativa: alinhar políticas e regulamentações financeiras e monetárias, bem como regras de comércio e investimento, com a necessidade de avançar para uma economia global de natureza equitativa.
2. Alinhamento de políticas de bancos centrais e instituições reguladoras: exigir que os bancos centrais assegurem que as ações dos atores, mercados e sistemas financeiros estejam alinhadas com os compromissos governamentais e internacionais relevantes em relação à natureza e ao clima.
3. Alinhar as finanças públicas com as necessidades de uma economia global e equitativa da natureza: ajustar a gestão financeira do setor público aos compromissos internacionais relacionados à natureza, expressos no Marco Global de Biodiversidade.
4. Responsabilizar legalmente os mercados de commodities alimentares em relação às pessoas e ao planeta: como maior e mais impactante mercado de natureza do mundo, cobrar ações do setor de commodities e exigir que formuladores de políticas públicas e reguladores estabeleçam rastreabilidade completa e transparência aprimorada sobre os impactos.
5. Garantir melhores benefícios econômicos para os guardiões da natureza: criar coalizões formadas por nações soberanas ricas em recursos naturais, povos indígenas e comunidades locais para fornecer serviços de natureza de alta integridade a preços acordados.
6. Endereçar os impactos perversos dos crimes contra a natureza: reduzir a incidência e o impacto dos crimes contra a natureza – a terceira maior fonte de fluxos financeiros ilegais – estabelecendo a exigência de que investidores e financiadores demonstrem uma cadeia de valor livre de ilegalidade.
7. Medidas convergentes sobre o estado da natureza: criar um acordo universal para medir o estado geral da natureza e garantir que os dados estejam disponíveis publicamente para evitar práticas de greenwashing.
A janela para mudar a economia e afastá-la do uso insustentável da natureza está se fechando. Embora exija mudanças radicais na forma como empresas, mercados e economias funcionam, as recomendações da Força-Tarefa podem proporcionar mercados mais equitativos e positivos, apoiando a transição para uma economia sustentável.
“Mesmo confrontados com interesses estratégicos divergentes, todos os países precisam se comprometer com uma economia global mais equitativa e positiva para a natureza, incluindo políticas comerciais e de investimento reformuladas, regulamentos, padrões e regras que regem as compras públicas e os subsídios”, avalia Simon Zadek, diretor executivo da NatureFinance e co-líder do secretariado da Força-Tarefa sobre Mercados de Natureza.
Notas
Sobre a Força-Tarefa sobre Mercados de Natureza
Foi criada em abril de 2022 com o objetivo de apoiar o desenvolvimento de uma nova geração de mercados de natureza significativos, que produzam resultados positivos e equitativos para a natureza e, ao fazê-lo, contribuam para atingir as metas climáticas. É uma iniciativa da Nature Finance, que também abriga o seu secretariado.
Integrantes da Força-Tarefa para Mercados de Natureza
Sandrine Dixson-Declève; Katrina Donaghy; Rebeca Grynspan; André Hoffmann; Naoko Ishii; Sylvie Lemmet; Joaquim Levy; Carlos Lopes; Bruno Oberle; Henry M. Paulson Jr.; Carlos Manuel Rodriguez; Nakul Saran; Vian Sharif; Almir Suruí; Rhian-Mari Thomas.
Sobre a NatureFinance
É uma organização internacional sem fins lucrativos, sediada em Genebra, dedicada a alinhar as finanças globais com resultados equitativos, positivos para a natureza e resilientes ao clima. Seu trabalho abrange iniciativas que estão construindo e utilizando dados de biodiversidade para uma melhor gestão de riscos relacionados à natureza, bem como desenvolvendo mercados de natureza com propósito, avançando inovações financeiras, inclusive em mercados de dívida soberana, e fortalecendo passivos relacionados à natureza.
Contato para a imprensa
Luciana Constantino – lucianamconstantino@gmail.com